Com o crescimento das mídias sociais na última década, a maneira das pessoas se comunicarem sofreu uma rápida transformação. Houve uma popularização que tornou a linguagem mais democrática, propiciando às pessoas opinarem sobre os mais variados assuntos e acompanharem o dia a dia uns dos outros.
Mas como se sabe nem tudo é uma maravilha nas redes. Em um primeiro momento, com a falsa impressão de um anonimato, usuários passaram a ofender outras pessoas, por vezes com condutas discriminatórias e racistas.
CULTURA DO CANCELAMENTO – A INTERNET SE TRANSFORMOU EM UM VERDADEIRO TRIBUNAL
O adolescente Lucas Santos, 16 anos, filho da cantora Walkyria Santos, tirou a própria vida depois de receber ataques em um vídeo publicado no TikTok. Segundo a artista, a rede social “nojenta” e os comentários maldosos na internet acabaram tirando a vida do seu filho.
“Hoje eu perdi meu filho, mas preciso deixar esse sinal de alerta aqui. Tenham cuidado com o que vocês falam, com o que vocês comentam. Vocês podem acabar com a vida de alguém. Hoje sou eu e a minha família quem chora”, escreveu a cantora em sua rede social.
“Isso é sobre o último post que eu havia feito, os comentários. Ele postou um vídeo no TikTok, uma brincadeira de adolescente com os amigos, e achou que as pessoas fossem achar engraçado, mas não acharam, como sempre as pessoas destilando ódio na internet. Como sempre as pessoas deixando comentários maldosos. Meu filho acabou tirando a vida. Eu estou desolada, eu estou acabada, eu estou sem chão. Mas estou aqui como uma mãe pedindo para que vocês vigiem e fiquem alerta. Eu fiquei o que pude. Ele já tinha mostrado sinais, eu já tinha levado a psicólogo, mas foi isso, foram só os comentários na internet, nesse Tik Tok nojento que fez que ele chegasse a esse ponto. (…) Eu estou desolada. Que Deus conforte o coração da minha família e que vocês vigiem que a internet está doente”, concluiu.
O advogado especialista em direito digital, Francisco Gomes Júnior, explica que “a internet não é terra de ninguém”, e que ofensas podem ser identificadas, investigadas e processadas judicialmente. Mesmo assim, os denominados “haters” ainda existem. São usuários que tem como única finalidade escolher um alvo para ofender, ameaçar e prejudicar. Além de celebridades que são vítimas dos “haters”, existem casos de pessoas comuns que se tornam vítimas do ódio de algum conhecido ou de alguém com quem se manteve relacionamento. Outro termo em voga é o “stalking”, usuários que perseguem outras pessoas de forma incansável, obsessiva e abusiva. “Essas condutas são criminosas, e precisam ser denunciadas”, alerta Francisco.
OPINIÃO – A ERA DOS INFLUENCIADORES QUE NÃO INFLUENCIAM EM NADA
O “stalking” foi recentemente definido como crime em nosso Código Penal e definido como a perseguição a alguém com ameaça à integridade física ou psicológica, perturbando a liberdade ou privacidade da vítima. Esse crime prevê reclusão de seis meses a dois anos, além de multa pelos danos morais causados. E o “hater” se cometer conduta discriminatória com discurso de ódio, poderá ser enquadrado como crime de injúria racial, que é o ato de ofender alguém em sua dignidade, utilizando elementos de raça, cor, etnia, religião ou origem.
“Além desses crimes, também devem ser apurados em uma agressão os crimes contra a honra, a calúnia, injúria e difamação. Enfim, não há mais impunidade para esse tipo de conduta nas redes sociais”, reitera o advogado, e continua “Caso você seja ofendido em algumas de suas redes sociais, não deixe o ofensor sair impune, a tolerância acaba alimentando a repetição da conduta. Ao receber uma ofensa reiterada, vá primeiro a um cartório e peça para fazer uma ata notarial, que é o ato do cartório que tem fé pública e comprova que a mensagem estava em seu celular, ou seja, que a ofensa foi concretizada. Com a ata, faça um Boletim de Ocorrência, que é a comunicação à autoridade policial para a apuração de um ato criminoso. É possível a realização de Boletim de Ocorrência online, ou seja, sem sair de sua casa”.
TIAGO ABRAVANEL: “A ORIENTAÇÃO SEXUAL DO OUTRO NÃO É DA OPINIÃO DE NINGUÉM”
O especialista explica que o próximo passo pode ser judicial ou não. Você pode optar por contratar um advogado para judicialmente obter o IP (endereço na internet) de quem praticou a ofensa e promover uma ação de reparação de danos, em paralelo à investigação criminal.
“Outra opção possível, caso o ofensor seja conhecido, é interpelar a pessoa, solicitando que ela confirme as ofensas ou que, em caso de alegado perfil falso, retire o perfil da rede social. O que é certo é que ofensas de ódio e ameaças não podem ficar impunes pelo fato de serem feitas pela internet. Se você for vítima, procure orientação e não deixe de denunciar”, finaliza o advogado.