Depois de um tempo de resistência, finalmente me rendi, assisti e me surpreendi com “Paternidade” (Netflix). É um filme interessante apesar de uma história que já foi usada em outros filmes, mas que flui com ar de novidade graças à representatividade negra que traz novas narrativas.
No longa-metragem, o ator americano Kevin Hart, mais conhecido por seu talento para a comédia, se aventura no drama ao interpretar Matt, um pai solo que ficou viúvo inesperadamente um dia após o nascimento de sua primeira filha, Maddy. Este mote traz algumas reflexões sobre a paternidade e a masculinidade.
Paternidade não é substituível

Vivemos em um mundo onde a figura paterna parece ser algo substituível e inferior à maternidade e isso se deve ao fato da ausência desta figura na criação de sua prole. Nas comunidades periféricas a percepção desta falta é ainda maior e as sequelas são profundas, mesmo para aqueles que dizem não sentir tanto. Ao mesmo tempo em que a sociedade recrimina a irresponsabilidade dos pais, esta mesma sociedade propaga o machismo, retirando o dever dos mesmos.
No filme, Matt toma pra si a criação solo de sua filha, mas encontra resistência das avós da criança, que duvidam da capacidade dele para tal feito. Nós homens, fomos criados para sermos servidos pelas mulheres, prover a manutenção de suas casas e somos excluídos da educação ativa de nossas crianças, deixando para as mães essa incumbência.
O pai não deve ajudar na criação de seus filhos ou filhas. Ele deve criar. Seja com a presença da mãe ou sem ela.
Paternidade deve ser encorajada

Todo apoio e ajuda é sempre bem-vinda, mas não deve ser retirada a obrigação.
Uma rede que se forma entre familiares e amigos é muito importante para a formação de uma pessoinha que está em desenvolvimento, e isso me lembra de um proverbio africano que diz: “É preciso uma aldeia para se educar uma criança”. Entretanto o progenitor precisa ser pai também e não se ausentar da aldeia.
Paternidade nasce na gestação

Sempre questiono quando ouço homens dizerem que serão pais mesmo suas parceiras já estando grávidas. As mulheres já se sentem e declaram abertamente que são mães. Porque isso não ocorre com os homens?
Assumir este encargo desde cedo é um caminho.
Fui criado pela minha mãe, e toda vez que ia passar as férias na casa de meu pai, ele se enchia de orgulho para falar que tinha um filho, e conforme eu ia crescendo, ele mostrava a satisfação diante dos amigos, mas durante o ano era a minha mãe que estava ao meu lado, me acompanhando, educando e formando meu caráter. Já adulto, tive um encontro com ele que gerou um reconhecimento tardio de suas falhas como pai.
Um homem negro que também foi atravessado pela ausência paterna e reproduziu isso aos seus. As sequelas podem ser sentidas até em gerações futuras, aquilo que passa de pai para filho e traz dores precisa ser extinto. Hoje somos bem resolvidos sobre esta questão e as feridas se tornaram cicatrizes.
Paternidade é presença

Uma eterna disputa é saber o que causa mais dores, a ausência afetiva ou física. Talvez nunca chegaremos a uma conclusão sobre isso, mas a presença faz toda diferença.
Thiago Pedroso, um amigo meu, compartilhou um pouco de sua vivencia na criação de Sofia, sua filha de 8 anos: “É muito fácil pra mim reproduzir condutas machistas, então o primeiro passo é olhar pra dentro de mim, reconhecer isso e tentar desconstruir. Isso é uma desconstrução constante. E os princípios que passamos é que Soso pode ser o que ela quiser, o que sonhar e nunca vamos limitá-la neste sentido. Além disso mostramos que o mundo é injusto, desigual para as mulheres. Mediante a isso colocamos ela em atividades esportivas voltadas à luta. Ela tem feito jiu jitsu e tem trazido um retorno benéfico. Estamos criando uma guerreira de Wakanda”.
Então, parafraseando um slogan muito famoso, “não basta ser pai, tem que estar!”