Em 2018, a atriz Tertulina Alves retornou à Macaúbas, município localizado no interior da Bahia onde passou parte de sua infância, para dialogar com mulheres que vivem na região e experimentam de diferentes formas as condições do sertão nordestino. Os relatos foram unidos à história da própria Tertulina e se transformaram na peça “Sertão Sem Fim”, que estreia em 5 de fevereiro, no Teatro Sérgio Cardoso, em São Paulo. A dramaturgia é de Rudinei Borges dos Santos e a direção é de Donizeti Mazonas.
Na peça, Tertulina interpreta Bastia, personagem que traz em seu corpo essas diferentes formas de se viver o sertão. As mulheres mais presentes na construção da personagem são a avó de Tertulina, Maria Tertulina, que nasceu no sertão Bahia, na região de Três Outeiros de Macaúbas e migrou para São Paulo, encontrada recém-nascida em um cesto de palha num curral; Maria Izabel, moradora da comunidade de Três Outeiros de Macaúbas e conhecida até hoje, com mais de 80 anos, como a Rainha das Cavalgadas; e da própria Tertulina Alves, cuja infância no sertão foi marcada por um período de forte seca.
A história de Bastia é marcada por uma imensa tragédia pessoal: seu marido, o vaqueiro Dão Sálvio, foi covardemente assassinado por fazendeiros da região. O motivo da morte de Dão Sálvio era a prosperidade do casal, que trabalhou duramente durante o período de estiagem e conseguiu adquirir um rebanho de sessenta cabeças de gado. Montada em um cavalo, ela percorre a cidade com o corpo morto do marido, em busca de justiça.
“No Sudeste ainda há um imaginário sobre o sertão que o remete quase sempre à seca. Em “Sertão Sem Fim” buscamos pensar em outras possibilidades de se retratar esse espaço. A Maria Izabel, por exemplo, é uma mulher que foi arrimo de família desde os 10 anos, tendo de trabalhar longe de casa, em espaços onde chovia com mais frequência, para que pudesse trazer sustento para a família”, conta a atriz.
Tertulina teve ainda outras conversas marcantes com mulheres de idades e relações distintas com o espaço – incluindo uma jovem de 25 anos que deixou a cidade e mulheres de 45, 75 e 100 anos, sendo essa última a responsável por contar à Tertulina histórias sobre a sua avó, que a atriz perdeu quando era criança.
Os relatos foram transferidos para Rudinei, dramaturgo e poeta ficcionista que assina a dramaturgia do espetáculo. “As narrativas, os trajetos e a história oral de mulheres sertanejas que eu sequer conhecia foram um convite, sobretudo ao exercício da escuta e da empatia. O que eu tinha em mãos era o registro de áudios, uma voz miúda, quase ao longe, que me contava uma trajetória de luta na terra e pela terra, fragmentos de memórias que testemunhavam a desigualdade social e as injustiças do Brasil profundo”, diz.
“Nossa questão foi olhar para o universo dessa mulher, nas suas questões que incluíam a falta de chuva, as desigualdades, a dificuldade de construir seu espaço no mundo e as injustiças”, diz Donizeti, complementando que a peça traz o sertão pra dentro da personagem, como se ele fosse também seu corpo. “O texto vem de um espectro de narrativa muito poética, o que ajudou a pensarmos na Bastia como o próprio sertão, sendo ela uma tradução da chuva, da aridez e da natureza”.
A peça teve o espaço cênico pensado pelo artista plástico Eliseu Weide e, com poucos objetos a vista, tem a síntese como premissa. “Os elementos são bastante sintéticos para se dar a vastidão e a multiplicidade do que pode ser o sertão”, explica Mazonas.
SERVIÇO
Peça – Sertão Sem Fim
Onde: Teatro Sergio Cardoso
Endereço: Rua Rui Barbosa, 153, Bela Vista – São Paulo
Quando: 5 a 22 de fevereiro
Horário: segunda, terça, quarta, quinta e sexta-feira às 19h
Quanto: R$ 10
Classificação etária: livre
Duração: 60 minutos
Informações: (11) 3882-8080