Ventos de Janeiro. Nasce uma estrela no Parlamento.

“Brasil acima de todos. Deus acima de tudo”
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07.01.2021

Rafa Canoba / Dagens Nyheter

O Brasil está passando por um dos momentos mais dramáticos da sua recente jornada em busca pela democracia. Desde 1988, ano em que ocorreu a constituinte nunca houve tantos ataques a este sistema político como nos dias atuais. 

Pautado neste slogan após o golpe de 2016, no qual foi destituída a presidenta Dilma Rousseff, nós assistimos a ascensão do Governo de Jair Bolsonaro e com isso veio à público uma série de práticas e correntes políticas ligadas a um conservadorismo pseudo cristão que tem promovido um processo de barbárie constante realizando assim um verdadeiro desmonte em instituições e valores nacionais. 

No mês de dezembro de 2020 chegamos a um total de 184.876 óbitos desde o começo da pandemia. E neste contexto de severa crise sanitária, econômica e política, ainda temos o presidente da república realizando campanhas contra a tão sonhada vacina e para piorar ainda contemporizando toda a catástrofe em que estamos envoltos.  

Em quase dois anos de mandato houve retrocessos em muitos setores como educação, na qual três ministros entregaram as pastas depois de envolvimentos em diversas polêmicas. No campo da cultura estamos assistindo um desfacelamento no audiovisual brasileiro, que inclusive foi confirmado em discurso recente, no qual o Presidente Jair Bolsonaro voltou a falar sobre a extinção da Ancine (Agência Nacional de Cinema). Ainda no cenário das artes a Funarte (Fundação Nacional das Artes), esteve envolvida em muitos escândalos incluindo o caso notório do ex secretário de cultura (Roberto Alvim) que foi demitido depois de usar discurso nazista em pronunciamento nacional.  

Está em curso um projeto político catastrófico que promove uma decadência afetando todas as áreas, algumas agudas e irreversíveis como a questão do meio ambiente. Em 2020 o país recebeu mais de 44 denúncias na ONU pela sua atuação na agenda climática. Omissão e conivência com os interesses de grandes corporações tem sido a marca principal do Ministro do Meio Ambiente (Ricardo Sales), que já coleciona processos por sua gestão vista como criminosa por órgãos nacionais e internacionais.  Neste ínterim, infelizmente batemos um recorde de 73% a mais de queimadas que no ano de 2019. Um panorama desolador que se agravou com os impactos da pandemia da Covid 19. 

“A Revolução será preta e feminina com a unidade da classe trabalhadora…” – Julia Reichert

Calma! Nem tudo está perdido.  Está havendo um processo de resistências e resiliência como foi visto nas últimas eleições municipais de 2020. Nunca antes na história foi tão amplamente debatido o conceito de representatividade na política partidária. E certamente um dos bons frutos deste processo foram as candidaturas de mulheres, comunidade LGBTQIA+, candidaturas indígenas e de movimentos negros que se estenderam por todas as praças do país. 

Um grande acontecimento foi a eleição de Erika Hilton, primeira vereadora mulher trans e negra do município de São Paulo. Eleita com exatos 50.508 votos, ela já fez história antes mesmo de assumir seu mandato. 

Nascida na periferia de Franco da Rocha (região metropolitana de São Paulo), a ativista atuou enquanto co-deputada à Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo pela Bancada Ativista (PSOL), que foi eleita em 2018. 

A mulher mais votada para a vereança da Cidade de São Paulo tem uma história digna de roteiro de cinema. Heroína de si mesma, foram muitas as batalhas que ela enfrentou até se tornar parlamentar. Na adolescência mudou de cidade e foi viver com tios evangélicos na cidade de Itu, interior de São Paulo. E neste período em que sua expressão de gênero se acentua, ela foi submetida a uma imersão na igreja. Sua família acreditava no caminho da fé como uma espécie de ponte para “curar” o mal ligado à sua identidade de gênero.

Em uma espécie de roteiro previsível ancorado na violência e destinando infelizmente a um número gigantesco de pessoas trans e travestis em nosso país, com ela não foi diferente. Morou na rua, precisou se prostituir e encontrou solidariedade, apoio e referência nas travestis que trabalham nas esquinas da Francisco Morato (cidade localizada também na região metropolitana de São Paulo). 

E no desenrolar da vida ela recuperou os laços familiares com a mãe. Foi no ano de 2013 que retomou os estudos e ingressou em um curso pré-vestibular. No panorama da militância estudantil encontrou sua vocação para política. E este exercício tem feito dela uma das esperanças na tão sonhada renovação da política brasileira.

Articulada, voz combativa com doses de ternura e muita simplicidade podem defini-la. Uma menina mulher da pele preta que encanta a todos por onde passa, sobretudo pela firmeza que imprime no trato pessoal. Desejamos toda a sorte do mundo para ela e que os ventos de janeiro possam renovar nossas forças e esperança. A vereadora foi procurada e respondeu uma pergunta exclusiva para o Portal Pepper. Questionada sobre quais seriam os seus maiores desafios, ela respondeu:

“Meu maior desafio será me manter firme diante das provocações e absurdos que acontecerão dentro da câmara. Será conseguir colocar em prática todos os projetos e metas que foram traçados para 2021. E como todos os anos o maior de todos eles será permanecer viva!” 

O Brasil lidera o ranking mundial de assassinatos de transexuais. Segundo ONG europeia em nenhuma outra nação há tantos casos de homicídios de pessoas transgêneras. Acompanhar a candidatura e eleição de Erika Hilton é acreditar que podemos e temos como missão reconfigurar esse mundo tão injusto e cruel.

Atualmente ela está lendo Carolina Maria de Jesus, Paulo Freire e Adilson Moreira.

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