“Se você não se deitar comigo, irei colocar na rua tu e seus meninos”, frase dita por Egídio (Vladimir Britcha), para Joana (Alice Carvalho), esposa de seu funcionário Tião (Irandhir Santos), na trama Renascer, exibida na TV Globo. Essa atitude é vivenciada por centenas de mulheres diariamente em todo o país – assédio moral e sexual são crimes. Segundo informações do Tribunal Superior do Trabalho, a Justiça Trabalhista recebe, em média, 6,4 mil ações relacionadas a assédio moral no ambiente de trabalho por mês. O cálculo considera o volume de processos iniciados em 2022, quando foram ajuizadas 77,5 mil ações trabalhistas com essa temática em todo o Brasil.
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Com base nos dados acima, a psicóloga Michele Bouvier, atuante na área de casal e família, violência de gênero e doméstica, comenta como é possível identificar um assédio no ambiente de trabalho: “Existem atitudes que são inadequadas, mas que dificultam a vítima a identificar de imediato o assédio, outras que são absolutamente visíveis, e outras muito sutis, estas normalmente são as mais danosas, que levam o indivíduo assediado, em grande parte dos casos uma mulher a sentir-se acuado (a), colocando a vítima muitas vezes em situações de vulnerabilidade, onde ela não consegue comunicar de forma a verbalizar o assédio sofrido. Quando falamos em assédio, muitas vezes estamos dando menor ênfase à “violência”, e permitindo que aquilo que está acontecendo com a vítima possa ser diminuído, ou seja, dá-se menos importância a um “assédio não caracterizando-o como uma violência”. O assédio é caracterizado como um ato de importunação de forma abusiva, com propostas ou palavras de forma a perseguir, causando constrangimento, expondo a pessoa a situação constrangedora”.
No remake, Sandra (Giullia Buscaccio), filha de Egídio, percebe um tratamento mais acuado e seco de Joana, ao ser questionada sobre como está sendo tratada por seu pai, o que faz acender o alerta de um possível “assédio”. “Você sabe que é um direito de todo trabalhador se sentir seguro no seu ambiente de trabalho?”, pergunta Sandra, que complementa. “Sem ser perseguida, coagida, agredida…”. Ao perceber que a empregada não fazia questão do que significa a palavra assédio, a garota de forma didática explica – “assédio é quando alguém no seu ambiente de trabalho tem algum comportamento impróprio com você. Geralmente um patrão ou superior, que se vale do cargo para te constranger ou te forçar a algo que você não queira fazer, sabe? Podem te humilhar, ou até dar em cima de você, criando situações que te deixam com medo ou envergonhada… Entende?”. Visualizando o incômodo de Joana, a filha do patrão deixa toda sua solidariedade e diz que pode contar com ela sempre que necessário.
“COM A INFÂNCIA ACABEI DESENVOLVENDO MUITAS COMPULSÕES E TRAUMAS”
Essa união, principalmente entre as mulheres, é de suma importância nessas situações, pois gera o acolhimento que a vítima necessita para criar forças e denunciar o abusador.
“Todas as formas de assédio são danosas, sejam elas de forma a um momento único, ou que se repita por outras ou muitas vezes, a diferença é a maneira que se consegue lidar com isso, pois assédios laborais em boa parte das vias levam a situações onde se não comprovado o mesmo, as respostas da ação denunciativa poderá vir a ser prejudicial em termos não apenas psicológicos, mas em termos materiais e profissionais, como a perda do emprego em questão, e muitas das vezes uma marca negativa no currículo, podendo gerar como dito acima danos psicológicos, físicos, econômicos e inclusive sexuais”, explica a psicóloga Michele Bouvier.
Outra cena importante aconteceu na reprise de Cheias de Charme, onde a personagem Penha (Taís Araújo) é assediada por Alejandro (Pablo Bellini) marido de sua patroa Lygia (Malu Galli). Mesmo repleta de dívidas, a empregada doméstica se vê na situação de avisar o ocorrido para sua contratante, pedindo demissão do emprego. Com informações do Tribunal Superior do Trabalho , o volume de ocorrências em que trabalhadoras e trabalhadores são vítimas pode ser maior, já que muitas pessoas têm receio ou não sabem como denunciar as práticas abusivas que sofrem no ambiente de trabalho.
“Os lugares de poder ocupados por homens e mulheres muitas vezes fazem com que estes indivíduos percam a noção da dignidade de tratar um cidadão em posição abaixo deles. Levando-os erroneamente a acreditarem que podem fazer o que quiserem. Estas pessoas devem ser sim denunciadas, quando em atitudes que ferem ou ultrapassam os limites de poder e dignidade no ambiente de trabalho”, frisa Bouvier.
Ao ser assediada, a vítima precisa procurar o mais rápido possível ajuda, caso tenha um setor responsável dentro da empresa, relatar o ocorrido e se proteger, caso isso não aconteça buscar as vias legais para que ela seja de alguma forma protegida. Outra ação é procurar por ajuda psicológica, caso a vítima não tenha um profissional psicólogo que a acompanhe. Infelizmente as formas citadas acima de maneira sutil de assédio, importunação ou violação de alguma forma da integridade física e psicoemocional desta vítima geram inúmeros danos, que nem sempre são visíveis de imediato, resultando em casos extremos como desencadear de burnout, depressão, crises de pânico e muitas outras questões que podem vir a acontecer devido a estes comportamentos.
“A maneira que cada ser humano encara suas dores e traumas são diferentes uns dos outros, não existe uma cartilha que diga como este ou aquele indivíduo vai agir ao sofrer muitas vezes a mesma violência. Cada ser humano é único, mas é fato que muitas questões podem vir a acontecer, em diferentes períodos e momentos da vida deste sujeito. Muitas vezes as manifestações são de ordem psicológica, psiquiátricas ou físicas, ou todas juntas, precisando então da intervenção de uma equipe multidisciplinar fazendo esta triangulação de cuidado à saúde desta pessoa”, finaliza Michele Bouvier.