MEUS OVOS FRITOS “DE MILHÕES”, RAPPORT, MANSPLAINING E ETIQUETA NAS MÍDIAS SOCIAIS

ANTES DE COMENTAR ALGO, PERGUNTE-SE: “SERÁ QUE AS MINHAS PALAVRAS VÃO AGREGAR ALGO NA VIDA DELA?”
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29.04.2022

Reprodução

Há alguns dias, meu cachorro foi diagnosticado com problemas graves renais, hepáticos e intestinais e vivia seus últimos dias com a gente: Nick foi muito amado e ficará para sempre em nossos corações.

Naquela semana, me desdobrei entre avaliações e trabalhos para corrigir, demandas de um evento grande, que teremos no curso de Administração, dar suporte emocional para minha mãe, ou seja, não consegui focar em fazer exercícios que me fazem tão bem, tampouco na minha alimentação, afinal, eu mesma gosto de preparar as minhas refeições, por questões de hobby e saúde.

VOCÊ JÁ ESCUTOU FALAR EM GENUINFLUENCERS E DESINFLUENCERS?

Na última sexta-feira de vida do Nick (8 de abril de 2022), depois de sua última bateria de exames, tive tempo de fazer ovos fritos para mim, do jeito que eu mais gosto: gema bem cozida e casquinha bem crocante por fora.

Lembro-me que o Erick Jacquin falou que ovo frito bom de verdade é aquele que forma essa película de sabor e crocância. Depois de um longo tempo sem fazer uma refeição decente em casa, fiquei tão feliz com meus ovos que acabei tirando foto e postando-a nas mídias sociais.

Após alguns minutos de interação com alguns amigos que gostam de gema mole ou mais cozida e amam a casquinha no ovo, deparo-me com uma mensagem de um homem que trabalha com as minhas amigas e que me seguia. Ele, que nunca tinha falado comigo, até aquele presente momento, me mandou a seguinte mensagem:

“Jesus, mas tá torrado, torresmo de ovo”. Escrevi educadamente para ele na sequência: “eu amo assim hahaha – Odeio ovo mole. Assim fica crocante, mas tem gente que gosta, neh”. Ele continuou: “sim eu também não gosto de mole não quer dizer, depende, se for um ovo poche ou Huevos Rancheros tem que ser com gema mole, mas é que esse tava muito queimado”.

 Como o indivíduo não se tocou, não hesitei em responder: “Migo… aquele ditado… o ovo é meu, neh. E estava maravilhoso. E aí a gente faz do jeito que a gente quer. Seja torresmo, mole, cru, duro 😉  Como diria o Mr Catra: “deixa as pessoa””

Não obstante, após detonar meus humildes ovos fritos, o amado fez o passivo-agressivo: “sim tava zoando só não achei que levaria a mal de boas”.

Para finalizar a conversa, respondi: “é que nem te conheço direito haha… Não é querendo c4g4r regra não, mas eu sou do time que se não tenho o que acrescentar de bom para a pessoa, eu fico quieta. E se a pessoa não deu intimidade, também não “brinco” com ela 😉 a gente não precisa fazer um ovo gourmet para postar e agradar os outros. Postei porque eu estava feliz e gostei do meu ovo. Enfim… é sobre isso”.

Parece uma conversa banal, mas eu queria tanto usar esse espaço para falar sobre algumas coisas que aprendi com ela. Eu acabei viajando, o Nick não está mais entre nós, porém, esse texto estava inquieto na minha cabeça (e como uma boa canceriana, eu não me esqueço).

Primeiramente, alguns amigos vieram me dizer que talvez o “cara” queria puxar conversa comigo e acabou se atrapalhando. Vamos então ao primeiro insight que tive lendo essa conversa.

Quando você quer se aproximar de alguém, você precisa primeiramente entrar no mundo dela, jamais parecer superior. Nós chamamos essa técnica de negociação de Rapport, palavra que possui origem francesa (rapporter), cujo significado é “trazer de volta” ou “criar uma relação”. De acordo com Marcela Andrade, para o site Negócios Digitais (2022), o conceito de Rapport é originário da psicologia e é utilizado para designar a técnica de criar uma ligação de empatia com outra pessoa, para que se comunique com menos resistência.

MESTRE DO SABOR MOSTRA QUE VOCÊ PODE FAZER DE MANEIRA DIFERENTE, SIM!

Ou seja, antes de sair falando o que vem na sua cabeça, tente estabelecer uma conexão com a outra pessoa. Você não precisa concordar com tudo que a pessoa fala ou posta, mas existem outras formas de abordá-la. O rapaz que falou do meu ovo, poderia ter se aproximado adotando um tom mais amigo, para posteriormente gerar afinidade.

Poderia ter dito: “caramba, adoro ovo, mas gosto dele um pouco mais mole. A casquinha crocante é muito boa”. Note que nessa nova frase, ele continuaria discordando do meu ovo (ponto da estrela do prato), mas traria dois pontos de conectividade: gostar de comer ovos e a crocância da casquinha.

Você pode usar essa técnica de Rapport para sua vida, observando o que há de congruente na conversa e expondo seu ponto de vista e convergência também, mas de maneira mais empática, elegante e educada, estabelecendo uma conexão, chegando de uma maneira mais sutil e humilde.

Mas Mariana, ninguém pode discordar de você, ou zoar da sua cara?”. Claro que pode (e deve), mas, para isso, a pessoa precisa estabelecer uma conexão antes comigo, ou saber como abordar o assunto, não é mesmo? Eu esperava de alguns amigos rirem do meu ovo “de milhões”, mas é que já compartilhamos tantas coisas juntos (alegrias, tristezas, dores, entre outros).

Uma vez, estava arrumando as coisas para viajar e uma ex-aluna me deu uma dica para caber mais coisas na minha mala, após ver uma postagem minha no Instagram: ela já foi comissária de bordo e a dica foi ótima – trabalhar com a calça esticada na mala, nunca dobrada. Ela trouxe o problema para si e me deu uma dica de ouro, além de ser empática e usar o Rapport na conversa, me auxiliando genuinamente.

Outrossim, observo mais um ensinamento dessa pequena conversa, que pode servir como uma dica de etiqueta na internet: antes de comentar sobre algo que uma pessoa postou, pergunte-se “será que as minhas palavras vão agregar algo na vida dela?” Digo isso, pois sou mãe de dois cachorros vira-latas, fora do padrão e algumas pessoas que me seguem já vieram falar que são feios (horrorosos foi a palavra utilizada), principalmente a Luna. Será que eu adotei uma cachorra que estava abandonada na rua por beleza, ou por amor aos animais?

Sei que o mundo não gira ao meu redor e que ninguém é obrigado a compreender o momento difícil pelo qual estava passando, contudo, uma das coisas que aprendi nesse diálogo foi tomar cuidado com as palavras que uso em minha comunicação, afinal, não estou isenta e nem sou um “alecrim dourado” que não comete erros na forma de expressar as minhas ideias ou sentimentos.

Há poucas semanas, em uma sala de aula híbrida (parte dos alunos em casa online, parte presencialmente), tive que explicar uma atividade cinco vezes para que alguns discentes a entendesse. Era fim da semana, eu já estava cansada, na última semana do ensino híbrido, acabei pedindo para uma aluna muito dedicada, que chegou atrasada, entender o que era para fazer com uma pessoa que caíra em seu grupo de atividade, pois não queria explicar pela sexta vez. O rapaz (que estava em casa) não sabia explicar a atividade para ela. Muitos alunos que estavam no presencial acabaram rindo, pois eles entenderam o contexto de toda situação (e do meu humor naquele momento).

A aluna se sentiu muito mal e eu percebi que fui grossa com ela. Conversamos pessoalmente, pedi desculpas e dei um pacote de Oreo para me redimir, afinal, é meu trabalho sanar as dúvidas dos alunos e a aluna não se atrasou porque quis (o mundo não gira ao meu redor) e nem sabia o que havia acabado de acontecer (alunos online dispersos e que não conseguiam entender a proposta da atividade, para entregar naquela aula).

Pois é, meus amigos, como diria a Bíblia: “Orai e vigiai”. A parte de que nem tudo é sobre mim já “está sendo trabalhada” na terapia.

Outro aprendizado extraído da história dos ovos: se não tiver intimidade com a pessoa e se ela não pediu a sua opinião, e esta machucá-la, não fale, ou use a empatia para dar feedback, como a técnica de Rapportsupracitada, por exemplo.

Também observei outro aspecto nessa conversa dos ovos: quem sempre vem me dar dicas do que tenho que fazer, de maneira passivo-agressiva, infelizmente são, na grande parte das vezes, os homens. As pessoas que falaram sobre a falta de beleza dos meus cachorros também são homens.

Observa-se duas questões na fala do amigo do ovo: me explicar como devo fazer um ovo frito pode ser considerado mainsplaining, termo que vem do inglês (man, que significa homem, e splaining, uma versão informal do verbo explain [explicar]), usado para descrever a atitude de um homem que tenta explicar algo a uma mulher, assumindo que ela não sabe sobre o assunto, subestimando sua inteligência (HuevosRancheros e Poché).

Eu me senti como se eu tivesse que fritar um ovo para agradar aos olhos dele, não para satisfazer a minha felicidade e alívio, depois de momentos tão difíceis com o Nick.

Nota-se que na conversa também há pitadas de gaslighting: não assumindo que falhou na hora de se comunicar comigo, o senhor do ovo, após “meter o pau” (hahaha) na minha peculiar receita, disse que estava “apenas brincando”.

Gaslighting é uma forma de abuso psicológico na qual informações são distorcidas, seletivamente omitidas simplesmente inventadas com a intenção de fazer o interlocutor duvidar de sua própria memória, percepção e sanidade.

Passivo-agressivamente, a pessoa quis mostrar que eu não sabia brincar, sendo que ele nunca falou comigo antes e veio criticar os meus ovos crocantes. Tomem cuidado, galera. Errou: peça desculpas e aprenda com tudo isso. Pare de jogar a culpa de sua rispidez na outra pessoa.

Além do mais, com esse episódio, aprendi que infelizmente ainda existem pessoas que esperam que nas mídias sociais você só poste a comida perfeita, a roupa perfeita, o cabelo perfeito, a paisagem impecável.

Essa busca incansável pela perfeição já sabemos aonde desembocará: depressão, crises de ansiedade, aumento de cirurgias plásticas e pessoas se endividando para parecerem que são algo totalmente diferente de sua realidade.

BODY POSITIVE: UM CONVITE A AMAR NOSSA APARÊNCIA DO JEITO QUE É

Eu, assim como muitos, estou cansada dessa vida de mentiras expostas nas mídias sociais e vou continuar sendo eu mesma, com meus cabelos brancos, cachorros vira-latas que aprontam, casa bagunçada, look cheio de pelos, repetidos e com roupas que não são de grifes e, quando são, foram adquiridas em algum brechó ou outlet.

Por fim, aprendi nesse episódio que ser eu mesma e trazer esses momentos de reflexão nas mídias sociais fazem com que as pessoas que te seguem gostem genuinamente de você, num mundo onde tudo está tão padrão, igual e artificial.

Alguns dos meus amigos chamaram o moço do ovo de “fiscal de ovo” e iniciaram um pequeno desafio no meu Instagram: “o desafio do ovo frito”. Muitos me marcavam na foto de seus ovos e falavam que gostavam deles bem fritos e crocantes, como os meus. Alguns declararam seu amor aos ovos de gemas moles e também me marcavam (afrontosos hahaha).

No final das contas, entendi também que “a boca fala sobre o que o coração está cheio”. Fica aqui, portanto, a reflexão da semana: Seu coração está repleto de amor ou de rancor? Convido-te a fazer das mídias um lugar mais saudável e harmônico, com gente mais real e conversas mais profundas.

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