Inicialmente composto nos primeiros dias de 2020, o novo disco da banda Ozu passa por dois anos pandêmicos de reflexão, reestruturação e reconfiguração. A partir desses processos, individuais e coletivos, ‘Burnout’ – disponível em todas as plataformas digitais – surge como um conceito que poderia definir muito bem o espírito dessa época em que vivemos.
SONGBOOK BAND – A NOVA PROMESSA DA MÚSICA POPULAR BRASILEIRA
“Estágios avançados do capitalismo neo-liberal diluíram e terceirizaram as desigualdades de nossa sociedade a tal ponto que nos foi privado a percepção de reconhecer os males macroeconômicos que nos assolam. Assim, desorientados, seguimos atribuindo nossos problemas financeiros e emocionais a nós mesmos, desenvolvendo então uma constante sensação de culpa, preocupação e ansiedade, nos exaurindo estruturalmente todos os dias”, refletem
“Por essas e outras, nenhum título, que não Burnout, poderia ser melhor para esse registro. Guerras e conflitos distantes servem como respiro para achar um “culpado” externo e desafogar a responsabilidade de nós mesmos. Porém, o mecanismo segue sendo o mesmo – ignorar os fatos e terceirizar as faltas. Filmes de heróis nos distraem, incessantes conteúdos de redes sociais nos entorpecem e assim seguimos em frente. Será que está tudo bem?”, conclui a banda.
Paradoxalmente, o grupo formado por Juliana Valle (voz), Francisco Cabral (compositor/tecladista) e Sue-Elie Andrade-Dé (guitarrista) desenvolve uma sonoridade menos sombria e mais dançante, sem perder sua já conhecida característica introspectiva.
Neo-soul, hip-hop e jazz estão, faixa a faixa, mais presentes, assim como os andamentos rápidos e marcantes. O trip-hop, estilo que fundou Ozu, também segue vivo enquanto o lo-fi hip-hop vem trazendo – em formato canção – o estilo que é hoje popular na internet em roupagens de produções instrumentais. “Adicionar letras para um estilo puramente instrumental foi um desafio intenso e prazeroso. Synths digitais emulam sonoridades antigas e plug-ins emulam gravadores de fita dos tempos passados, criando novos timbres ricos em dois mundos. O novo imita o velho”.
Seguindo essa estrutura, vocais doces protagonizam uma postura menos contida e muito mais expressiva. Os acordes estão mais ricos e ganham destaque. Como um todo, o super trio deixa de lado o estilo minimalista e se arrisca em composições complexas.
Visualmente, na capa que ilustra o álbum, artistas buscam encontrar solidão na vida urbana, escuridão em cenários exageradamente iluminados e beleza em lugares comuns. “Queremos desconstruir e abstrair as primeiras intenções arquitetônicas para chegar a uma visão lúdica das grandes metrópoles que nos formam intelectual e musicalmente. Robert Smithson passeando por Cotia, nossa cidade natal, seria o cenário perfeito”.
Anarquitetos de ruínas, apreciadores do concreto abandonado e arranha-céus sem propósito, Ozu é para quem gosta de um groove agridoce e de ícones como Erykah Badu, Portishead, Dj Krush, Buttering Trio, Surprise Chef, Abstract Orchestra e Bonobo. “Com essa obra propomos uma reflexão na escuta, um convite a diminuir o ritmo das nossas vidas e olhar não só para o que está ao redor, mas também para nós mesmos”, finalizam. Ouça na íntegra: