Mulher, é tempo de curar-se! Tempo de cuidar-se!
A palavra cura vem de cuidar. Cuidar no dicionário significa “imaginar, meditar, aplicar a atenção, o pensamento, a imaginação; ter cuidado; fazer os preparativos; prevenir-se; ter cuidado consigo mesmo”. O que significa cuidar pra você? Como você se acolhe e se cuida no caos pandêmico desses tempos?
O mover do corpo pode ser um caminho de cuidado. A dança cura. Ela cuida movimentando estruturas não visíveis e massageando regiões não palpáveis. O movimento feito com prazer e cuidado por si mesma pode ser simples e fazer parte do dia-a-dia de forma delicada e sensível: a possibilidade de mudar a posição do corpo agora e se espreguiçar um pouco, ou acordar e mover-se a partir dos seus desejos, ou fazer uma automassagem na hora do banho, fechar os olhas e se deixar imaginar, ou dançar nua pela casa.
As reações bioquímicas do corpo ao dançar são reações de prazer, a adrenalina e o cortisol circulam e chegam aos músculos e ao coração, o corpo relaxa e o cérebro libera endorfina, dopamina e serotonina que são hormônios de bem-estar.
A história da dança nos conta que antes de falar, dançamos, a primeira manifestação comunicativa. Ao expressar sentimentos e desenhar emoções o corpo fica leve e parece que o ar corre mais tranquilo, fica mais fácil respirar. Dançar pode ser um desabafo daquilo que não pode ser dito. O movimento do corpo não mente.
A PELE: SINTA O QUE TE TOCA – O TOQUE É UMA NECESSIDADE
Os ritos de colheitas, na idade média, eram danças para a natureza. O corpo é natureza, isso nos permite dançar para nós mesmas como respeito a nossa história, marcas e ancestralidade. Somos feitas de uma dança de partículas, o núcleo atômico é uma estrutura que se move e interage sem parar. Dançamos porque somos.
Andressa Abreu, Moon Mother, criadora da @teiamagica e instrutora de yoga dance diz que para ela a dança é “um dos atos mais importantes no caminho de autoconhecimento e poder feminino. Ela reconecta o seu sagrado. Por que? Porque dançar é relembrar a sabedoria ancestral de que a dança foi apontada como uma das primeiras forma de devoção, nos antigos tempos as mulheres dançavam como forma de oração, devoção e para sacramentar esse universo, essa dança sagrada está muito enraizada nas nossas lembranças, por isso essa alegria e sensação de voltar ao lar quando dançamos além do corpo, além do sentir. A dança reconecta o corpo feminino e ressignifica o valor e poder da mulher, permite o contato com seu corpo, resgatando a consciência através do encontro com sua beleza sagrada e não importa o corpo, só basta te-lo para que a dança, esse ritual do sagrado, nos leve de volta ao centro do nosso ser, trazendo a transformação e a cura. E que dança? A sua dança, sem certo, nem errado, feio ou bonito e sim, a dança que move seu corpo desenhando o que está na sua alma”.
O corpo dança por ser corpo. Todos os corpos dançam. A dança na sua origem não exclui. O convite para dançar a vida é para todas mulheres com ou sem útero. Fechar os olhos e se conectar com a sua dança mais profunda, a música pode ser a respiração. O pulsar do coração, o ritmo. Os pensamentos agitados, o mote. O movimento que vem nessa conexão já é dança, sentir o carinho do ar te tocando e perceber que o sangue borbulha com a elevação da temperatura. Nessa coreografia não ensaiada a intuição diz o próximo passo. O corpo é um labirinto de histórias, dançar é honrar as próprias raízes.
Na contemporaneidade, houve um distanciamento da Mulher Selvagem cíclica, negação da sabedoria ancestral. Uma das formas de manifestar e potencializar essa cura é pela união das mulheres a partir da troca de saberes, da escuta e do movimento corporal que é a potência do que somos, como forma de dar nomes aos medos que nos foram colocados e “sair da energia separatista do patriarcado. Patriarcado é guerra, é competição; pouco se olha, pouco se conhece de si mesmo. É um sistema em que o importante é consumir e produzir, não há tempo para afeto, acolhimento e amor” (depoimento de Ma Devi Murt no livro Círculo de mulheres).
“A mulher da contemporaneidade quando se reconhece feminina, para além da disparidade de gêneros, se percebe em conflito porque se encontra na tentativa/desafio do vira-ser. E é principalmente o seu corpo que possibilita reconhecer-se como centelha da transitoriedade e do caos, quando todos os sentidos estão/são relativizados“, escreve Naranda Costa Borges em sua tese “Dançatar: Sobre Mulheres, Trajetórias e Narrativas em Dança” pela Universidade Federal da Bahia.
A dança é uma possibilidade de reconexão com a intuição e a expressão das emoções. Dançar e sentir prazer é uma reexistência feminina de expressão integral do ser corpo, caminho de empoderamento, entrega e conexão à ancestralidade, encontro com a essência mulheril.
“Nenhum outro som no ar pra que todo mundo ouça
Eu agora vou cantar para todas as moças
Eu agora vou bater para todas as moças
Eu agora vou dançar para todas as moças
Para todas Ayabás, para todas elas” – As Ayabás de Maria Bethânia.