“Esboço” – Primeiro livro da trilogia da anglo-canadense Rachel Cusk, tem belas reflexões sobre a poética do cotidiano

Somos esboço de nós mesmos e da humanidade
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20.02.2021

Rii Schroer / Divulgação

Sabe a sensação de vida retalhada, em fragmentos? De que não sabemos realmente quem somos, a não ser fagulhas de tempo e dos outros? Ou de que somos eternamente inacabados, que falta algo, ou alguém, para a almejada completude? Estas e tantas outras dúvidas existenciais afloram durante a leitura de “Esboço”, da anglo-canadense Rachel Cusk, primeiro livro da trilogia que leva o mesmo nome. No Brasil, a editora Todavia já lançou também a sequência, intitulada “Trânsito”, e irá publicar o título final, “Kudos”.

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Quando foi lançado, em 2014, “Esboço” gerou muitas repercussões entre os críticos literários e a autora recebeu elogios por sua narrativa simples e cirúrgica. É preciso dizer que este romance experimental não irá agradar quem procura grandes reviravoltas ou revelações: não há uma história tradicional – com começo, meio e fim, mas sim múltiplas narrativas dos encontros da protagonista, sempre contadas de forma fluida. Faye, recém-divorciada, é escritora e professora universitária, e, num certo verão, vai ministrar um curso de escrita criativa em Atenas, na Grécia. Seu primeiro interlocutor é o vizinho de poltrona do avião. Depois, um colega professor, um amigo, os alunos do curso, enfim, relatos de diferentes pessoas sobre muitos assuntos, como relacionamentos, família, sonhos, desejos.

“Esboço” é sobre as experiências de cada um, afetos e percepções. Este trecho é emblemático: “identificação, preocupação – o que mais lhe dava medo era que as fronteiras que separavam esses vários tipos de bagagem mental, as distinções entre eles, ruíssem, de modo que ela não tivesse mais certeza do que havia lhe acontecido e do que havia acontecido com gente que ela conhecia, ou às vezes até do que era real e do que não era”. As reflexões do livro são sempre rápidas, mas belíssimas: “Às vezes já me pareceu que a vida é uma série de punições para tais momentos de desatenção, que uma pessoa molda o próprio destino com aquilo em que não repara ou pelo que não sente compaixão; que aquilo que você não sabe e não se esforça para entender vai se tornar exatamente a coisa que você será forçado a conhecer”.

É também uma miríade de narrativas de sucessos e fracassos, ambos absolutamente dependentes da perspectiva de quem conta e de quem escuta. “A capacidade humana de se autoiludir é aparentemente infinita — e se for assim, como é que podemos saber, a não ser existindo num estado de pessimismo absoluto, que mais uma vez estamos enganando a nós mesmos?” Para quem busca uma leitura rápida, mas extremamente profunda e engrandecedora, “Esboço” é o livro perfeito. A condução da escrita irá te deixar ainda mais confuso sobre si e sobre os outros: é, no fim das contas, uma maravilhosa conversa sobre a vida e a poética do cotidiano. Afinal, “sua consciência estava tão abarrotada não apenas com as próprias lembranças, obrigações, sonhos, conhecimentos, e com a profusão de responsabilidades do seu dia a dia, mas também com as de outras pessoas — acumuladas ao longo de anos de escuta, conversas”.

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