Escravidão – Se for para sermos escravos, que sejamos da libertação, do amor e do respeito

Tudo ainda é sobre poder, dinheiro, competição, glorificação, sociedade do espetáculo - Tudo é sobre o eu, nada sobra para o ‘nós’
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03.02.2021

Reprodução / Divulgação

Escrevo esse texto em meio a tórridos sentimentos trazidos pelos jornais e redes sociais. Nas últimas semanas muito se reportou sobre pessoas encontradas em lugares vivendo e/ou trabalhando em condições análogas à escravidão. Num primeiro momento, a gente fica petrificado. É quase que engolir agulhas pela boca e entender que ainda exista esse tipo de coisa nesse mundo – tão massacrado, tão contado, tão historiado e tão sentido até hoje pelas dividas históricas que causaram a tantas pessoas, em especial ao povo preto.

E aí, depois da petrificação, como sempre faço quando o assunto me modifica, fiquei a pensar – ou melhor, filosofar- para além do assunto. Sobre o ato, sobre quem é escravo de quem… E do quê. Comecemos analisando que vivemos em uma sociedade dita moderna, com estruturas e avanços em vários níveis, com a informação na palma da mão (QUALQUER informação, graças a democratização e uso da internet, você pode ler sobre praticamente todos os assuntos – e aprender).

Os avanços são diários em todas as áreas da vida humana. E por que sobre o comportamento não? Sobre a mente não? Como pode existir um ser humano que ache que tem direito sobre outro, literalmente? Essa pergunta me levou a um caminho que quero partilhar aqui com vocês, visto que escrever é meu desabafo e minha cura.

Tenho lido e assistido vídeos que deixam claro uma coisa: a evolução não dá saltos! Mas o que isso tem a ver com o assunto? – Você pode imaginar. Me farei entender. Estamos todos, em grande parte, lutando pelas melhorias sociais. Pelos direitos de trocas de nomes sociais de pessoas lgbtqia+, de querer adicionar a linguagem neutra, de lutas pelo direito do abroto, igualdade social entre pessoas sem defini-las pela sua raça/cor/sexualidade/religiosidade. E tantos outros direitos que poderíamos enumerar aqui.

Ora, se a humanidade não dá saltos, e dando uma piscadela nas notícias e nas barbáries que estamos assistindo, como esperar garantir todos os direitos citados acima, se não aprendemos, enquanto seres humanos, o básico: a respeitar o outro, a garantir que ele possa ter oportunidades igualitárias, a garantir que ninguém será morto pelo que é.  Entende que isso seria o nível 1, e já estamos lutando lá na frente no nível 35. E não há como usufruir conscientemente das conquistas de qualquer direito sem o direito básico alcançado. Por que assim sendo, podemos exemplificar: você ainda pode ser xingado no pronome feminino, você ainda pode ser espancado no pronome neutro. Você ainda pode não ter oferta de emprego. Você pode ser marginalizado, jogado a guetos.

Você pode continuar tendo sua plenitude cortada diariamente. E fazer do medo e insegurança seus melhores amigos. E isso já conhecemos bem! O que falta é a mudança básica, o senso de humanidade que deixou de existir – se é que algum dia existiu – para podermos finalmente dizer que somos humanos. Pois por enquanto somos animais vivendo num mundo evoluído demais para nossa mente atrasada demais. Tudo está evoluindo rápido e nossa mente ainda não acompanhou.

Somos, de certa forma, escravos. Escravos dos nossos desejos primitivos, que nos impulsionam a preservação do eu. Não da espécie. Tudo ainda é sobre poder, dinheiro, competição, glorificação, sociedade do espetáculo. Tudo é sobre o eu, nada sobra para o ‘nós’. Trazendo uma frase ouvida há milênios, eu sempre tive uma visão da frase de Jesus; amar ao próximo como a ti mesmo. Essa frase tem 2 mil anos, e ainda não aprendemos esse básico aí. E meu entendimento cresceu ao longo dos últimos anos.

Essa frase significa amar o direito da pessoa viver como ela quiser, não fazendo mal a ninguém o resto é problema das escolhas dela. Amar nesse caso tem a ver com a unidade, a preservação do direto da espécie em se permitir. Já o gostar envolve conhecer aquela pessoa, saber quem ela é e ainda assim escolher gostar dela todos os dias.  Amar tem um peso, gostar tem outro. E tenho entendido isso em níveis que eu mesmo desconheço. Nessa polarização, 8 ou 80, onde um grupo odeia o outro pelas escolhas que fizeram, ou ainda, por características que os diferem, quem perde são todos. Não há como dormir tranquilo a noite sabendo que o mundo está como está. E você sabe disso. Sei que as notícias mexem com seu psicológico, te revoltam, te envergonham, dá vontade de virar um eremita. Sumir para uma ilha ou no meio de qualquer mato e nunca mais saberem nada de você.

Mas aí você estaria escravo do eu. E muitas pessoas ainda perdem seus potenciais sendo escravas desse eu. Olha para lado! Você conhece várias pessoas assim…

Quer um exemplo explicito do quanto somos evoluídos, mas com a mente atrasada: as redes sociais! Dar acesso a seres que não sabem o que significa respeito, o poder de comentar e falar o que quiserem para todo mundo você achou que daria o que? Uma rede saudável de diálogos? Um debate onde todo mundo gostaria de aprender com as visões do outro e não impor sua verdade? Essa utopia não vai ocorrer enquanto eu viver e eu já estou em paz com isso. O que eu faço é tentar transformar dessa minha visão de utopia numa realidade na minha rede.

E todas essas escolhas têm consequências. Sexo vende, briga vende, dar opinião sobre tudo vende, fazer de sua vida um show de Truman vende. É o reflexo do nível da mente que vivemos. Professores e cientistas que estão mudando o mundo não são lembrados na rede, mas vai colocar uma foto de sunga com o ‘pau marcando’ para ver a quantidade de seguidores que você adquire. Escravos da imagem e do ideal de corpo – e do falo –  perfeito.

Enquanto vivermos bombardeados por notícias como as das pessoas em vidas análogas à escravidão, o Norte da longa distância a percorrer nos indica o trabalho a ser feito. Compreender o nível evolutivo, educar e transformar.

Se for para sermos escravos, que sejamos da libertação, do amor e do respeito.

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