Quem tem acompanhado os Jogos Olímpicos de Tóquio provavelmente já notou a ausência da bandeira da Rússia durante as disputas, substituída pelo símbolo do Comitê Olímpico Russo. Nem mesmo o nome do país é citado nas estatísticas e programações oficiais do evento, que limita-se a identificá-lo pela sigla ROC, equivalente em inglês para as iniciais do comitê. Além disso, a execução do hino nacional russo está vetada. Desta forma, antes das partidas de modalidades coletivas e durante as cerimônias de entrega de medalhas (quando seus atletas conquistam o ouro, é claro), os russos optaram por ouvir um trecho de uma peça de Piotr Tchaikovsky (1840-1893), mais famoso compositor clássico do país.
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As medidas, válidas por dois anos, foram impostas ao país pela Corte Arbitral do Esporte em dezembro de 2020 e se aplicam a todos os campeonatos mundiais esportivos, incluindo a Copa do Mundo do Catar e os Jogos Olímpicos de Inverno de Pequim, ambos marcados para o ano que vem. Trata-se de uma punição pelos subsequentes e comprovados escândalos de manipulação de testes antidoping sob consenso do governo russo, que permitiam aos seus atletas competirem sob efeito de estimulantes de alto desempenho.
As suspeitas remontam à Olimpíada de Inverno de Sochi, sudoeste da Rússia, realizada em 2014, e começaram a se confirmar às vésperas dos Jogos do Rio, em 2016. Já naquele ano, toda a equipe de atletismo russo foi impedida de competir na Cidade Maravilhosa. As investigações prosseguiram nos anos seguintes, culminando na referida decisão, que se assemelha mais a uma inócua nota de repúdio do que a uma condenação proporcional à gravidade do fato.
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‘Ícaro’, documentário de Bryan Fogel que venceu o Oscar da categoria em 2018, se inicia como um despretensioso experimento por parte do diretor, ciclista amador de grandes percursos que pretende investigar se é facilmente possível burlar os testes antidoping realizados antes, durante e após as competições. Suas pesquisas o levam a Grigory Rodchenkov, antigo responsável pelo Centro Antidopagem russo. Já durante os primeiros contatos entre os dois, a manipulação dos testes durante a Olimpíada de Sochi começa a ser revelada ao mundo e o nome do químico surge como a cabeça por trás da escandalosa operação.
Com Vladimir Putin, ex-agente da KGB e atual presidente da Rússia, não se brinca e Rodchenkov se vê obrigado a buscar abrigo nos Estados Unidos, com a ajuda de Fogel. A partir daí – e mal chegamos a um terço do filme – o documentário se transforma em um eletrizante suspense investigativo. Enquanto preserva a vida fugindo de seu próprio governo e preocupado com a situação da esposa, ainda na Rússia, o cientista vai revelando os vergonhosos detalhes do maior esquema antidesportivo já desvendado.
Oportunamente, Rodchenkov lançou um livro este ano onde esmiúça ainda mais todo o sistema criado para favorecer os atletas russos. ‘O Protocolo Russo’ foi lançado no Brasil pela editora Avis Rara e está à venda nas principais lojas físicas e online do setor.
Ícaro (Icarus) – EUA, 120 min, 2017 Dir. Bryan Fogel – Disponível na Netflix – Assista ao trailer: