Eu fui tocada demais pelo novo filme do diretor Adam Mckay, “Não Olhe para Cima”, uma sátira muito inteligente, que reflete os absurdos trágicos (cômicos só no filme) de nossos tempos: machismo, racismo, negacionismo, a positividade tóxica da mídia ,a alienação da população, por meio de fake news e valorização exacerbada dos artistas, o jogo de poder e o capitalismo selvagem, acima da ciência e da salvação sublime da humanidade. Se você ainda não assistiu, esse é o seu dever de casa: a película está disponível na plataforma de streamings Netflix, desde dezembro do ano passado.
Na obra, o diretor Adam McKay, em parceria com o roteirista David Sirota, usa a metáfora do cometa para sinalizar todo caos vivenciado no século XXI, principalmente tudo que a degradação do meio ambiente trouxe para humanidade, ao longo da Revolução Industrial… e eu achando que iria pilotar carros voadores em 2022… doce ilusão.
Por conta do desiquilíbrio ecológico, nos últimos anos, fomos arrebatados com a chegada de uma nova variante de um vírus que jamais fora visto pela humanidade – Covid-19, ou SARS-CoV-2 – um coronavírus identificado pela primeira vez em Wuhan, China, no final de 2019, o qual se espalhou rapidamente pelo mundo todo.
De acordo com o site do Instituto Butantan, no final de março, a OMS (Organização Mundial de Saúde) divulgou um relatório de 120 páginas, desenvolvido por cientistas da China e de outras partes do mundo, que reforçou a origem natural da epidemia. A tese mais aceita diz que o vírus passou do morcego para um mamífero intermediário, e dele para o ser humano. A transmissão de um morcego diretamente para um humano também foi apontada como uma hipótese possível e provável.
O relatório ainda afirmou que a passagem do vírus para humanos por meio de produtos alimentícios é possível, porém uma hipótese remota. Já a possibilidade de o vírus ter escapado acidentalmente do Instituto de Virologia de Wuhan foi classificada como “extremamente improvável”. De acordo com o diretor-geral da OMS, no entanto, o relatório era um começo no caminho de determinar com precisão a origem do vírus, e não um fim.
Muitas teorias da conspiração surgiram ao longo desse caminho e uma delas falava que a China havia criado o vírus em laboratório para comprar ações e dominar economicamente o mundo. Porém, ao darmos ouvidos aos cientistas, notamos que, por conta da globalização e do desenvolvimento tecnológico, o homem adentra a lugares que nunca havia explorado antes, modificando assim o ecossistema de uma região, ao poluir, matar espécies de plantas e animais, levar e trazer doenças que estavam longe das cidades superpopulosas e espalhando rapidamente, por conta da velocidade dos transportes.
Além do Covid-19, nos últimos meses, o Brasil foi assolado por catástrofes naturais, as quais já eram previstas acontecer: alagamentos nos estados da Bahia e Minas Gerais, uma grande onda de calor no Sul, em contrapartida, seca e desabastecimento de água em outros Estados.
Como já dizia Mahatma Gandhi, “Seja a mudança que você quer ver no mundo”. Logo, fiquei nesses dias de férias refletindo como podemos ser pessoas melhores em 2022 e pensei no poder que temos em nossas mãos, enquanto consumidores. Não estou falando apenas do básico, que é economizar água, energia e reciclar o lixo ou não jogá-lo na rua, estou falando em melhorar as suas escolhas, enquanto consumidor.
Você sabia que, segundo a FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura), 70% de toda a água consumida no mundo é usada na irrigação das lavouras, na pecuária e na agricultura? A indústria responde pelo consumo de quase 20% e as residências, apenas 12%.
Você sabia que, para se fazer uma calça jeans, desde o cultivo, coleta do algodão, até o produto chegar à sua casa, utiliza-se 10 mil litros de água? Para cada litro de leite são necessários mil litros de água e pasme: para cada quilo de carne bovina, consome-se 17 mil litros de água em sua produção.
Não estou falando aqui para você vender tudo que conquistou e ir plantar hortaliças nos alpes isolados e não comprar mais nada, afinal, consumir faz parte da vida moderna e não damos conta de produzirmos tudo o que precisamos. Meu papel aqui vai para refletirmos a maneira com a qual nós consumimos e fazermos pequenas mudanças em nosso dia a dia. Imagina se os mais de 200 milhões de brasileiros deixassem de consumir carne por um dia da semana, o quanto isso seria bom ao meio ambiente, ou fizessem as mudanças que pontuei abaixo? Realmente, minimizaríamos grande parte das catástrofes naturais recentes. O poder está em nossas mãos, consumidor!
Ao comprar um item ou contratar uma empresa para execução de um serviço, verifique atentamente quem é a organização que o produziu.
A Geração Z cobra cada vez mais uma postura mais ativista das empresas, que auxilie em transformar o mundo num lugar melhor para se viver (minimização da desigualdade social e de gênero, pobreza, fome, trabalho escravo, aquecimento global, teste em animais, extinção de espécies, entre outros).
Logo, ao comprar um item, seja crítico e se pergunte: “o que essa empresa faz para reduzir a quantidade de plástico no planeta?”, “qual a procedência dessa peça?”, “por que esse produto está tão barato?”, “será que existe diversidade trabalhando nessa empresa e na comunicação do produto?”, “de qual material esse produto é feito? Dá para reciclar?”.
Segundo o estudo lançado pelo WWF, o volume de plástico que vaza para os oceanos todos os anos é de aproximadamente 10 milhões de toneladas, o que equivale a 23 mil aviões Boeing 747 pousando nos mares e oceanos todos os anos – são mais de 60 por dia. Nesse ritmo, até 2030, encontraremos o equivalente a 26 mil garrafas de plástico no mar a cada km².
O Brasil, segundo dados do Banco Mundial, divulgados pela WWF, é o 4º maior produtor de lixo plástico no mundo, com 11,3 milhões de toneladas, ficando atrás apenas dos Estados Unidos, China e Índia. Desse total, mais de 10,3 milhões de toneladas foram coletadas (91%), mas apenas 145 mil toneladas (1,28%) são efetivamente recicladas, ou seja, reprocessadas na cadeia de produção como produto secundário.
Sabe aquela famosa frase: “Quando a última árvore tiver caído, quando o último rio tiver sido poluído, quando o último peixe for pescado, vocês vão entender que dinheiro não se come”, da diretora Alanis Obomsawin? Parece que ela finalmente surtiu efeito no mundo corporativo. As empresas se tocaram que não há crescimento econômico, se há desiquilíbrio ambiental e social no planeta, se não há matéria-prima e pessoas que possuam poder de compra para adquiri-lo.
Portanto, surge recentemente um conceito denominado ESG (Traduzido do inglês-Governança Ambiental, Social e Corporativa) que refere-se a uma avaliação da consciência coletiva de uma empresa, em relação aos fatores sociais e ambientais. Normalmente, é uma pontuação compilada de dados coletados em torno de métricas específicas relacionadas a ativos intangíveis dentro da empresa, métricas essas cada vez mais cobrada e utilizada pela B3 – bolsa de valores.
De acordo com o site FADC (2021), os três pilares do ESG são:
Environmental ou Ambiental: refere-se às práticas corporativas voltadas ao meio ambiente, por exemplo, debate sobre aquecimento global, diminuição da emissão de carbono, poluição do ar e da água, desmatamento, gestão de resíduos, entre outros.
Social: está relacionado à responsabilidade social e ao impacto da empresa em prol da comunidade como respeito aos direitos humanos e às leis trabalhistas, diversidade da equipe, segurança no trabalho, proteção de dados e privacidade, envolvimento com a comunidade, investimento social privado, entre outros.
Governance ou Governança: está ligado às políticas de administração da empresa como a conduta corporativa, composição do conselho, práticas anticorrupção, existência de um canal de denúncias, auditorias, entre outros.
A B3 possui o Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE B3), que mede o desempenho médio dos ativos de empresas selecionadas pelo seu comprometimento com a sustentabilidade empresarial. O ISE B3 serve como base para os investidores na tomada de decisão e induz as empresas a adotarem melhores práticas voltadas ao assunto, contribuindo, assim, para o crescimento dos negócios (FADC, 2021).
Logo, consumidor: fique de olho nos indicadores das empresas que você consome e investe seu dinheiro.
Dê prioridade nas compras de itens de segunda mão
Lembra que eu escrevi aqui que para produção de uma calça jeans, leva-se 10 mil litros de água? Quando for comprar algo, questione se de fato você necessita daquilo e, caso precise, sempre priorize comprar itens de segunda mão, afinal, eles já estão produzidos e não precisam da extração de mais recursos naturais para sua existência. Você pode fazer isso por meio de aplicativos, como “Enjoei” e “Troc”, lojas físicas e virtuais de brechós, entre outros. Eu, por exemplo, quero comprar uma bike e considero a opção de adquirir uma seminova.
Vale também lembrar – para que um item exista, há produção de 70 vezes seu tamanho em resíduos, em média, de acordo com o curta “A história das coisas”. No caso da moda, questione-se se a peça que es FADC (2021), está comprando combina de várias maneiras, ou é fruto de um modismo passageiro, que fez você perder seu tempo e dinheiro adquirindo-a.
Reduza o consumo de carne
Além da grande quantidade de água para sua produção, (para cada quilo, 17mil litros), a produção de gado é responsável por desmatar a vegetação, principalmente a do Cerrado, para dar lugar às pastagens que os alimenta, matando assim toda fauna e flora da região, bem como ocorre o assoreamento dos rios, já que o boi entra nas margens desprotegidas de nascentes e as pisoteia, prejudicando todo ecossistema.
De acordo com o Greenpeace, a produção de carne é responsável pela emissão de gases poluentes e acelera os efeitos do aquecimento global. Por isso, precisamos refletir sobre os limites dessa produção para a preservação de nossas florestas, o incentivo à agricultura familiar e a manutenção do clima global.
Além do mais, você contribui para minimizar o sofrimento de animais, e também conhece outras fontes de proteína, ampliando seu cardápio e se tornando consequentemente mais saudável.
Não precisa cortar a carne de vez da sua vida, caso não consiga: adote um ou dois dias da semana para não consumir proteína animal. Existe um movimento denominado “Segunda Sem Carne” que mostra que, em 2017, só de as pessoas deixarem um dia da semana de comer carne, economizou-se 57 bilhões de litros de água, 500 milhões de terras plantadas e, consequentemente desmatadas, 280 mil toneladas de CO2 deixaram de ser emitidos, e 150 mil toneladas de soja, que vão para alimentar o gado e degradam o meio ambiente, deixaram de ser produzidas. Mais uma vez o consumo (r)evolucionando.
Compre de produtores locais e hortaliças da estação, dando prioridade ao que é fresco, ao invés do industrializado
A monocultura (plantações gigantescas de soja e milho), assim como o gado, são responsáveis por degradar o meio ambiente, já que precisa-se desmatar tudo para sua produção. Quando compramos de produtores locais, desenvolvemos a economia local e resgatamos nossa cultura, já que muitos vendem hortaliças que só há naquela região. Lembro-me que fui passar as férias em Carrancas (MG), capital das cachoeiras, e em um restaurante local tive a oportunidade de experimentar um vegetal chamado Azedinha (PANCs – Plantas Alimentícias Não-Convencionais), cultivado pela dona do estabelecimento.
GRETA THUNBERG DESTACA OS GRAVES DANOS DOS ATUAIS SISTEMAS DE PRODUÇÃO ALIMENTAR
Além disso, ao comprarmos apenas frutas, verduras e legumes de dada estação, consumimos menos agrotóxico e forçamos menos o solo a ter que produzir algo que não é de dada época.
Outra forma de consumirmos conscientemente é substituirmos os produtos industrializados, por produtos frescos, ou fazermos nossa própria refeição, ao invés de pedir pelo delivery. Além de fazer bem para saúde, geramos menos lixo (perceba o quanto de embalagens descartamos, ao comprarmos mais produtos industrializados no mercado, ou pedirmos comida via Ifood).
Não compartilhe uma notícia (fake news), se você não em certeza de que esta é verdadeira, ou não compartilhe notícias que possam acabar com a vida das pessoas
Você já parou para pensar que uma simples notícia pode acabar com a vida de uma pessoa e pode propagar mentiras e desinformação? E se essa pessoa fosse seu filho ou fosse você?
Eu me lembrei de um vídeo que foi disseminado uma vez no whatsapp de uma mulher que alegou que estava indo fazer a unha e o marido a pegou o traindo e compartilhou o vídeo em suas mídias. Você já parou para se perguntar se ali é lugar para resolver uma traição? O que você tem a ver com isso? E a vida dessa mulher, dos seus filhos e parentes? E o psicológico dessa pessoa?
Não adianta nada, galerinha, fazer campanha para setembro amarelo e continuar divulgando fake news e falando barbaridades na internet. Que tal ler um bom livro, fazer projeto social, dedicar-se aos seus hobbies e terapia, ao invés de descontar suas frustrações na internet?
Além do mais: quais são as pessoas que você segue e dá voz nas mídias sociais? O que ela contribui para melhorar o mundo? Ela só estimula o consumo hedonista, ou ela abarca assuntos importantes, sobre LGBTfobia, feminismo, racismo, desigualdade social… de quem você consome o conteúdo nas mídias?
Finalizo esse texto com duas frases que fazem total sentido para mim: “não adianta protestar na internet, se você não ajuda a mãe a lavar a louça” ou “não adianta ter doutorado e não cumprimentar o porteiro”.
Que todos nós possamos ser exemplos em 2022. Muito mais do que gente que polemiza nas mídias, precisamos de pessoas que façam a diferença, que coloquem a mão na massa para mudar o planeta. E não precisa de muito: é só você rever seu consumo e com simples atitudes já pode fazer muito pelo planeta, que há tempos respira por aparelhos.
