por Patrícia Palumbo
Um álbum de estreia carrega sempre um universo. São muitas camadas para uma escuta atenta, que é a que queremos. Conhecimentos, sentimentos, vivências, desejos. No disco “Leal” percebemos um mundo diverso e contemporâneo com todas as suas belezas e contradições. É bonito encontrar referências da cultura popular, de Lenine, Chico César, Roberto Carlos, escolhas estéticas e políticas, filosofia de vida e poesia.
LEAL DIVULGA PRIMEIRA ETAPA DE SEU PROJETO DE ESTREIA – O EP INTITULADO “SIM”
Leal ouviu Bob Marley, Luiz Tatit, fandangos do Vale do Ribeira e Caixeiras do Divino. Leu Neruda e Leminski, pesquisou danças brasileiras, carnaval e violões. Seu primeiro disco chega inteiro autoral. Todas as faixas, de um lado e do outro lado, tem propósito. Provocar, emocionar, fazer pensar, fazer dançar. Gostei de ouvir essas canções que inspiram movimento. Que seja o sutil pesar dos cílios lembrando um amor bem vivido, uma vontade de balançar os quadris, uma inquietação nos pés ou no coração aflito com as tragédias sócio ambientais que assolam o país e o planeta.
Música tem que mexer porque é via de acesso, é cura, é amor, é história. E aqui a roda gira, o boi dança, a ciranda chega à praia. “Leal” vem lembrar que mesmo na cidade, centro ou periferia, a natureza é mãe. Com esse repertório afetivo, muitas leituras e andanças, “Leal” traz sonhos de uma vida melhor, de convivência e aprendizado. É preciso escutar. Eu poderia falar de um mergulho ao ouvir esse disco e conhecer sua história, mas a sensação é mais de se embrenhar pela mata e com quem vive dentro dela.
Conversamos sobre a presença de vários mestres que fundamentam essa caminhada. E esses vão de Jung (sim, Carl Gustav, o psiquiatra) até Tião Carvalho, maranhense de Cururupu, um dos maiores divulgadores do folguedo do boi e compositor de maravilhas. A música em “Leal” promove um “moitará”, palavra linda que significa um encontro de tribos, para passar a mensagem e emoldurar uma narrativa. Sem encontro a vida não anda. Para chegar em “Leal”, o disco, Leal teve parceiros e parceiras importantes.
Lua Leça, mestra na escuta ativa e planejamento criativo, e Rebeca Brack, diretora criativa especialista em branding e planejamento estratégico, assinam a direção artística do projeto. Com Lua ele trocou sobre seu lugar nesse mundo da arte e da música, abriu o repertório, buscou novos parceiros musicais e outras vozes para o disco. A partir daí entra Big Rabello, baterista e um dos produtores, que encontrou em Leal um compositor com muita diversidade de estilos e arranjos, um artista que conhece muito o Brasil, viaja muito pelo Norte e Nordeste, com grande escuta para harmonias e percussões brasileiras. Felipe Roseno, percussionista e também produtor, destaca as misturas do regional brasileiro com o pop, mas sem perder a conexão com a raiz, com o chão de terra batida.
E vejam que capricho nesse elenco de músicos, arranjadores e participações especiais – Bia Ferreira, mulher preta, lésbica, compositora, é perfeita no flow da faixa “Jardim a Jardim”. O gigante Ney Matogrosso escolheu cantar a deliciosa “Karma” depois que ouviu a canção no fone de Felipe Roseno. Davi Kopenawa, voz necessária, é uma presença poderosa em “Lógica Maneira”. Foram vários encontros em terras amazônicas antes do chamado da música. Por isso as palavras, com esse arranjo potente de muitas vozes, nos conectam verdadeiramente com a luta. O amor é ação, nos ensina bel hooks.
O ser político não prescinde da beleza e mesmo da alegria, nos mostra Leal com a ajuda preciosa de instrumentistas que estão entre os melhores que conheço. Leia a ficha técnica, por favor! É com alegria que lhes apresento Leal. Um cantor e compositor consciente de seu lugar no mundo e disposto a fazer diferença. Um cantautor, um letrista observador para além de seu quintal pronto a aprender com pássaros e palavras, mestres e biomas e devolver todo o encanto. Ouça o álbum na íntegra: