No final de 2016 a mania da internet era o “mannequin challenge” (ou “desafio do manequim”), em que um grupo de pessoas permaneciam imóveis, como se estivessem no meio de alguma ação ou movimento, enquanto alguém passeava entre elas gravando a cena. A brincadeira foi tão popular que diversos programas de televisão a reproduziram em seus palcos, envolvendo apresentadores, plateia, convidados e equipe técnica na proposta.
No entanto, o francês Alain Resnais (1922-2014), um dos grandes cineastas da história, filmou cenas muito semelhantes mais de 50 anos atrás. Em ‘O Ano Passado em Marienbad’ (1961), um de seus filmes mais icônicos e enigmáticos, há uma sequência, com cerca de um minuto de duração, que se passaria tranquilamente por um refinado “desafio do manequim” do século 21 – em clima de extremo mistério e suspense, é bem verdade, tendo em vista a tenebrosa fotografia de Sacha Vierny (1919-2001), frequente colaborador do diretor, acompanhada pela angustiante música de Francis Seyrig (1927-1979) – veja a cena mais abaixo.
Apesar da narrativa fragmentada e recheada de elementos oníricos ter espantado boa parte do público, o filme conquistou o Leão de Ouro, principal prêmio do tradicional Festival de Veneza, além de indicação ao Oscar de roteiro original para o autor Alain Robbe-Grillet (1922-2008). Ao lado de ‘Hiroshima, Meu Amor’ (1959), seu primeiro longa-metragem, ‘Ano Passado’ é considerado, hoje, uma das obras-primas de Resnais.
Cartazes França, Alemanha, Japão e EUA
Ao lado de nomes como Godard e Truffaut, o diretor, cuja morte completou quatro anos no início de março, foi um dos principais expoentes da “nouvelle vague”, movimento que eclodiu na passagem entre os anos 1950 e 1960, combatendo o excesso de academicismo e a falta de inovação estético-narrativa que então predominava no cinema francês. Seus efeitos inspiraram ações semelhantes em diversos lugares do mundo, incluindo o “cinema novo” no Brasil (Glauber Rocha, Nelson Pereira dos Santos) e a “nova Hollywood” nos EUA (Coppola, DePalma, Scorsese).